Há já algum tempo que reflito sobre a constatação de que a sociedade no geral, caminha perigosa e irremediavelmente para o abismo da conveniência. A conveniência é hoje em dia uma Pandemia tão ou talvez mais perigosa que a Covid 19, uma vez que ao contrário desta, não tem fim à vista e o Ser Humano parece ter-se acostumado ou melhor, escravizado a ela.

Há muito que noto nos meus alunos a sua incapacidade de tomar decisões. De refutar aquilo que casualmente lhes acontece ou é proposto. Assumem perante tudo uma atitude de “conveniência”. É assim porque é mais fácil.

“Não fui para outra escola porque esta é mais perto.” ; “Quando terminar o curso vou trabalhar no que aparecer.”  “Comemos batatas fritas e bebemos ice tea ao almoço porque não nos apetece esperar na fila da cantina.” ; “Fiz copy paste deste texto que encontrei na net em Brasileiro porque é mais fácil”.

A Conveniência é justificação para quase tudo. Principalmente para a demissão de algo que caracteriza (ou será caracterizava?) o Ser Humano. Pensar, Refletir e tomar decisões.

Tenho refletido muito sobre este tema tentando encontrar uma justificação para esta tamanha dependência da conveniência. Fomos nós que caminhámos para aqui ou fomos trazidos até aqui?

A resposta ou pelo menos parte dela, surgiu-me no outro dia quando fui para fechar a bagageira do carro de um amigo meu e não me foi possível decidir como fazê-lo. Se de repente, com força ou com gentileza. A única tomada de decisão que me foi permitida foi premir num botão. Fiquei a olhar para aquilo e tive o meu momento “Uau”! Já não somos livres, de num acesso de raiva, fechar a bagageira do nosso carro com estrondo. Carregamos apenas num botão. “É mais fácil.”; “Não tens de fazer força.”; “Não arriscas a estragar a porta.”, dirão ou defensores da conveniência.

A simplificação da nossa vida não tem em princípio nenhum mal. Desde que em momentos especiais, momentos em que por situações excepcionais, nos vemos obrigados a simplificar, a tornar as nossas decisões mais fáceis ou convenientes.

Se pensarmos bem, imensos problemas da sociedade atual advêm na conveniência e simplificação das nossas vidas.

A obesidade um dos grandes flagelos atuais, advém dos hábitos que as famílias adquiriram através da conveniência de colocar uma refeição congelada tirada da prateleira do supermercado no microondas, em vez de perderem tempo a confecioná-la com ingredientes frescos.

A poluição e o excesso de plástico na nossa vida, advém do facilidade que representa poder carregar qualquer coisa num saco de plástico ou da conveniência de ser mais barato do que outros materiais como o vidro por exemplo.

A solidão e os problemas de saúde mentais a ela associada em faixas etárias cada vez mais jovens, nasce da conveniência de hoje em dia não termos sequer de sair de casa para estarmos conectados (estaremos?) ou para termos amigos (teremos?).

O excesso de exposição a ecrãs tão prejudicial ao desenvolvimento de crianças é igualmente justificado pela conveniência de transformar os miúdos em zoombies, em vez  tê-los a correr pela casa aos berros ou a trepar-nos pelas costas.

Estes são apenas meros exemplos de flagelos atuais que têm como epicentro esta pandemia da conveniência ou a sua tirania como fala Tim Wu no seu artigo, The Tyranny of Convenience publicado no New York Times .

É esta simplificação quotidiana incutida e praticada desde cedo, que nos leva a aquilo que a mim me preocupa, a incapacidade dos nossos jovens e menos jovens, agarrarem o leme da sua vida e darem as guinadas necessárias de forma a aproximarem-se do que é para si realmente importante, e construirem percursos de vida com significado.

A dificuldade das pequenas coisas do dia a dia, dão valor ás mesmas. Dão significado à nossa existência, e até por paradoxal que possa parecer dão-nos tempo.

Sim. Porque quando não simplificamos as coisas somos obrigados a “perder” tempo com elas, e assim a ter tempo também para nós. A conveniência é enganadora pois ao simplificar-nos tanto a vida, faz como que não nos detenhamos em nada e de repente saltando de conveniência em conveniência o tempo escapasse-nos entre os dedos e no final não nos sobrou tempo para nada.

Nem mesmo para com estrondo … fechar a bagageira.

#KeepDreaming

Texto da Autoria de Rui Loureiro Mentor do Projeto Sonhadorismo